Um mês de preparativos e a mudança finalmente está encaminhada. Dias encaixotando e carregando coisas para o novo apartamento, até que venha o caminhão "oficializar" tudo... Dias também para remexer em lembranças pálidas por meio das tralhas que a gente guarda por puro saudosismo. Dentre as relíquias encontradas, minha produção caseira de quadrinhos; a baqueta que o percussionista da banda do Ben Harper atirou pra galera e que caiu, fortuitamente, aos meus pés; recibos de salários do meu tempo de estagiário em uma agência de publicidade - meu primeiro emprego - e, principalmente, minhas fotos impressas, quando máquinas digitais eram peças de luxo. Também tive que me conter para não passar o dia relendo meus quadrinhos do Asterix e Calvin & Haroldo, sob risco de não cumprir o cronograma apertado.
Ao longo da vida, a gente vai juntando essas quinquilharias e a mudança é uma oportunidade rara de se livrar de uma considerável parte dela. Meus CDs de música, por exemplo, foram todos distribuídos. Na era do MP3, não faz mais sentido manter pilhas de discos mofando e juntando pó, ainda mais para quem sofre de rinite alérgica. Há quem curta e até prefira escutar nos discos, mas eu não sou nem um pouco saudosista neste aspecto.
Assim como as fotos, a organização dos discos também se tornou uma viagem tipo "Túnel do Tempo". Músicas são parte da nossa vida, impregnam as memórias e acabam se tornando referências e reflexos de nossas personalidades. E lá estavam eles, os meus quatro primeiros da coleção - presentes de Natal da época em que o Plano Real equiparou nossa moeda ao dólar e nos devolveu poder de compra. Uma época, também, em que a MTV brasileira chegava pela antena parabólica, e com ela, todas as novidades do cenário musical, pois naquela época a MTV realmente se ocupava de música. Lembro que a emissora concedia uma honraria aos astros de primeira grandeza, ao anunciar que os clipes de estreia seriam exibidos nas horas pares de um determinado dia. Guns N´Roses, Madonna, U2 e Michael Jackson foram alguns homenageados.
Mas eu estava falando dos 4 primeiros. Foram eles: Nevermind do Nirvana, Ten do Pearl Jam, Money For Nothing do Dire Straits e Automatic For The People, do R.E.M.. Todos eles se tornaram clássicos, e o mais desconhecido da lista hoje talvez seja o R.E.M., mesmo que o álbum tenha sido eleito um dos 3 melhores da década de 90, junto com o Nevermind e OK Computer, do Radiohead. Mesmo assim, "Automatic..." ainda é o meu favorito do quarteto. A partir dele, meu horizonte musical se abriu consideravelmente, já que ainda havia muita tribalização de gostos musicais da juventude da época, especialmente com rock pauleira em suas diversas vertentes. Caras que gostassem de todo tipo de som eram vistos meio que como aliens, e eu era um bom exemplo disso, embora não desse a mínima.
"Automatic..." foi uma experiência única, porque me apresentou um R.E.M., incensado com o megasucesso "Losing My Religion", como uma banda muito mais eclética e versátil do que eu pensava. E tudo está ali - o piano de Mike Mills em Nightswimming, órgãos, violoncelo (como na belíssima Sweetness Follows) com as distorções elegantes de guitarra que se tornaram marca registrada de Peter Buck... As músicas do álbum, mesmo as mais agitadas, mantém aquela atmosfera introspectiva, permeada de imagens do interior dos Estados Unidos, e naturalmente sublinhada pela voz grave de Michael Stipe. É possível encontrar inúmeras referências a personalidades mortas de maneira trágica. Everybody Hurts é uma preocupação de Michael Stipe com a onda de suicídios que acometia os jovens da época, e dizem que Kurt Cobain, amigo pessoal de Stipe, escutou muito a música dias antes de se matar. Man On The Moon foi uma homenagem ao comediante Andy Kaufman - sim, aquele mesmo interpretado por Jim Carey no filme "O Mundo de Andy" - muito antes do filme sair. Embora digam que Find The River é uma homenagem póstuma ao jovem ator e ex-promessa de Hollywood, River Phoenix (morto precocemente ainda em início de carreira por overdose), isso não é verdade posto que a morte ocorreu dois anos depois do lançamento do CD. Mesmo assim, é uma das melhores músicas do álbum.
Enfim, é um daqueles raros CDs em que você escuta do início ao fim, sem pressa nem vontade de pular uma faixa. Por isso mesmo, fica difícil escolher uma favorita... Coloco aqui, então, o vídeo que me apresentou essa obra-prima, Drive (clique aqui). Não me lembro direito, mas acho que esse vídeo também teve exibição nas horas pares no dia de sua estreia na MTV. Cheers!


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